sábado, 17 de dezembro de 2022

democracia gamificada

 


A GAMIFICAÇÃO DA DEMOCRACIA



Introdução

Para Rousseau, democracia não é para os homens. Somos violentos, passionais e mentirosos. A democracia é um governo para os deuses. A verdadeira relação da democracia com os jogos olímpicos não é que essa forma de governo se assemelhe ao jogo pela regra que se deve respeitar, mas porque ambos exigem dos participantes a superação de seus limites em um constante aperfeiçoamento, porque em ambos os homens aspiram a ser deuses.

Há uma grande semelhança entre a democracia e os jogos, em suas origens. Mas, exatamente em que? Ambos são processos de tomada decisões em comum? Regimes em que se mantem a unidade sem perder a diversidade? Há algo maior e mais interessante: tanto a democracia como os jogos exigem a superação individual e coletiva das dificuldades; ambos obrigam os homens a dar o melhor de si, domesticando o ruído através da consciência. A democracia e os jogos devem nos levar a ser o melhor possível.

Há uma narrativa clássica (BOBBIO, 2000a, p.171), em que o príncipe persa Otane pergunta a um de seus mais versados sábios sobre qual a melhor forma de governar seu reino. O sábio, então, enumera três formas de governo: o governo de um (a monarquia), o governo de poucos (a aristocracia) e o governo de muitos (a democracia); que tanto podem funcionar bem e serem formas justas de governar como também podem degenerar em injustiças e desperdícios, dependendo de seus governantes. O governo de um ou monarquia se for ocupada por um rei ruim se torna uma tirania; a aristocracia (ou “o governo dos melhores” de Platão), através dos privilégios e do nepotismo, se transforma em oligarquia; a democracia (ou o governo pela maioria), sem espírito público, se fragmenta em anarquia individualista em que cada um defende seu interesse ou ainda descamba para oclocracia (o governo da plebe).

Bobbio (2000a) usa essa antiga narrativa para defender a ideia de que o bom governo é o governo das leis e não o governo dos homens. Com leis, até as monarquias e aristocracias são justas, pois a justiça independe das virtudes e defeitos dos governantes. Já a democracia, principalmente a democracia moderna, é o governo das leis por excelência. Bobbio aproxima as ideias de ‘governo dos homens’ e de ‘governo das leis’ às noções weberianas de legitimidade carismática e de legitimidade legal, dando a entender que fazem parte do mesmo processo histórico de secularização das tradições, em que a democracia é meia-irmã da burocracia.

A democracia dos antigos era direta; a democracia dos modernos, representativa. Como será a democracia no futuro?

As promessas não cumpridas

Bobbio não crê na volta da democracia direta através das redes digitais de computadores, em que cada cidadão vota em sua casa sobre quaisquer assuntos de seu interesse, mas sim que vivemos uma passagem gradativa da democratização do Estado à democratização da sociedade e das instituições (da escola, da fábrica, dos bairros). Esta democratização da sociedade civil começou com o movimento da contracultura em 1968 e se consolidou com a queda do muro de Berlim em 1989. E a mídia teve um papel pedagógico importante durante essas últimas décadas.

Giddens chama este processo histórico institucional de “democratização da democracia”, miniaturizando ainda mais a ideia de democracia, entendida agora não como uma 'forma de governo', mas como um método de relacionamento entre pais e filhos, entre grupos de amigos, entre marido e mulher (GIDDENS, 2003, p.61).

Explico-me melhor: a democracia como método não consiste simplesmente na regra de maioria (pois assim seria impossível existir democracia entre duas pessoas com interesses diferentes, como professor e aluno, por exemplo), mas sim no novo contratualismo, isto é, na negociação dos interesses divergentes e das próprias regras de negociação. A democracia vista desse modo não é o predomínio formal do consenso sobre o dissenso, mas na transformação substancial dos conflitos em diálogos produtivos dentro de uma unidade de ação. Assim, como método, a democracia não é 'uma decisão coletiva através da regra da maioria', mas a tomada de decisões através das regras negociadas entre os diferentes pontos de vista que formam uma organização.

E então a questão central desta democracia negociada é: como criar o mínimo de regras que garantam a cada um segundo seu esforço e capacidade tanto do ponto de vista quantitativo como no aspecto qualitativo. Para que as instituições gozem do máximo de autonomia em relação ao Estado e em que os indivíduos desfrutem do máximo de autonomia pessoal em relação às instituições não basta que se garanta direitos iguais a todos, é preciso também tratar todos como pessoas especiais. Pois é na diversidade e na autonomia das relações entre os grupos sociais e os indivíduos que repousa hoje a possibilidade de uma democracia cada vez mais múltipla, complexa e produtora de singularidades.

Em O Futuro da Democracia, Bobbio (2000a) estabelece um marco teórico em relação à compreensão desta democratização das relações humanas. Nele, evitando fazer projeções apressadas sobre o destino da democracia contemporânea, Bobbio investiga suas “promessas não cumpridas”, isto é, aquilo que as democracias representativas gostariam de ser idealmente, mas que efetivamente não são.

São seis promessas não realizadas:

  • A democracia política prescinde de uma democracia social. A democracia representativa promete se realizar através das eleições para o parlamento e para os cargos executivos, mas nas últimas décadas ficou claro que, para sobreviver e se desenvolver institucionalmente, ela precisa reinar também a sociedade civil.

  • Na democracia, todos governem todos, igualitariamente. Mas, o pluralismo dos grupos acaba com a democracia dos indivíduos. A democracia moderna nasceu de uma concepção individualista de sociedade, em que a vontade coletiva é produzida pela regra de maioria e acatada por todos formando uma unidade de ação “de forma centrípeta ou monocrática”. Porém vivemos uma policracia, em que os grupos (e não os indivíduos) lutam para preservar seus interesses. Um conjunto de oligarquias ou de corporações profissionais é uma sociedade pluralista, mas não é democrática.

  • A democracia promete defender o interesse público, mas apenas negocia acordos dos interesses privados. Há uma flagrante contradição entre a representação do interesse público (da vontade da maioria) com a representação dos interesses privados em diferentes níveis. A democracia parlamentar (e seus representantes eleitos) promete defender o interesse público da maioria, mas há na verdade defendem os interesses regionais, corporativos e pessoais.

  • A democracia promete acabar com os privilégios das elites, tratando todos os indivíduos de forma igual, mas há uma persistência das oligarquias e do tratamento desigual. Há inclusive conservadores que defendem ser democrático tratar desigualmente os desiguais e que todo igualitarismo político é invariavelmente autoritário.

  • A democracia promete ainda educar o povo para cidadania, transformando súditos em cidadãos, aumentando a participação ativa de todos sobre tudo. Mas, o que se constata é a crescente apatia política dos jovens de melhor instrução e renda.

  • A democracia promete acabar com o poder invisível. Na monarquia, o segredo em torno do rei era a regra e a exceção era a visibilidade. A coroa, o trono, o castelo – signos da visibilidade real escondiam a opacidade da vida cotidiana. Nas democracias, a transparência é a regra e o segredo, a exceção. O poder do soberano imitava o de Deus, que é invisível e tudo vê; o poder democrático ao contrário se baseia na visibilidade total do governante por pessoas que ele não vê. No entanto, apesar desta inversão de perspectiva, a democracia convive com um ‘governo duplo’ em que ao lado da esfera visível pela mídia, se desenvolve toda uma política de bastidores. A transparência não venceu a privacidade dos acordos particulares.

Mas apesar destas “promessas descumpridas”, em nenhum momento Bobbio desiste do regime democrático como a melhor (ou, por baixo, “a menos pior” – como disse De Gaulle) forma de governo. Sua crítica visa antes levantar as deficiências institucionais e os pontos fracos da democracia para tentar desenvolvê-la.

Mas, o que nos interessa é saber qual papel os meios de comunicação desempenham nesta democratização social da democracia política representativa?

A espetacularização da política

Jurgen Habermas (1984, 2012a, 2012b) nos traz três temas conexos: a ampliação da esfera pública pela sociedade civil; a “ação comunicativa” diferenciada da “ação instrumental” e da “ação estratégica”; e a “democracia deliberativa”. Habermas entende que a racionalidade instrumental é a lógica objetiva das coisas, a ação determinada pela infraestrutura econômica; a racionalidade estratégica dos sujeitos individuais e coletivos corresponde a ação política e seus condicionamentos superestruturais; e a ação comunicacional é a esfera da intersubjetividade coletiva e da interação inconsciente, que está sujeita simultaneamente às racionalidades instrumental e estratégica.

A noção de democracia deliberativa é a união da ação comunicativa com a racionalidade estratégica contra a razão instrumental, ou a ampliação da esfera pública pela sociedade civil contra o mercado. A aproximação dos campos da política e da comunicação acabou provocando o fenômeno que os analistas chamam de 'espetacularização da política'.

O campo político é o lugar em que se geram, na disputa entre os agentes que nele se acham envolvidos, produtos políticos, problemas, programas, análises, comentários, conceitos e eventos, entre os quais os cidadãos comuns são chamadas a debater e decidir, durante as eleições. É, portanto, um campo fechado (em que seus agentes internos interagem na maioria do tempo), que se abre sazonalmente a todos, durante os breves momentos eleitorais.

O Campo da Mídia é o ambiente de visibilidade simultânea, que funciona segundo suas próprias regras e subverte a lógica de premiação de outros campos. A mídia ocupa uma dupla posição em relação à estrutura social, ela é tanto um Campo próprio (em que os atores sociais debatem seus problemas) como também um agente no Campo Político mais geral.

Graças a essa ambiguidade funcional, os meios de comunicação são 'meta jogadores', que 'bancam' a democracia. Os meios de comunicação são instituições políticas de mediação das elites com o público, mas não substituem os governos, os parlamentos, os partidos e os demais atores políticos - apenas se sobrepõem a eles, 'dando as cartas do jogo', selecionando e interpretando todas as informações de um campo para os outros.

O resultado imediato dessa ambiguidade institucional é que, enquanto há abordagens midiafóbicas, que enfatizam o aspecto negativo das mudanças, ressaltando o campo social como o conjunto da esfera pública e a mídia como um agente social nefasto; outras, midiafílicas, percebem apenas o aspecto positivo, enfatizando a mídia como um campo aberto para o diálogo direto entre os agentes políticos e o público.

A maioria dos autores contemporâneos postula uma posição intermediária: os campos da Política e da Comunicação se interpenetram numa relação recíproca, mais ambos preservam suas especificidades; nem a política se dilui frente ao efeito da mídia, nem a mídia é um mero instrumento da política ou alienação social. Observando a inter-relação entre os dois campos podem-se localizar vários elementos: a) o que há de político na comunicação (o subcampo jornalístico); b) o que há de comunicação na política (a imagem pública e a propaganda política); c) o que há na política que não está na comunicação (a negociação invisível); d) o que há na comunicação que não está no campo político (o simbolismo aparentemente apolítico do mundo do entretenimento).

A política se midiatizou, passando a se organizar pela gramática dos meios de comunicação (com ênfase na novidade, no inusitado e em padrões estéticos), produzindo uma cultura centrada no consumo de imagens, gerando novas competências, como marketing (que adapta a política às preferências do público através de pesquisas) e semelhança aparente entre a opinião pública e o mercado consumidor.

Pode-se dizer, no entanto, que os campos da comunicação e da política estão em convergência, que sua intercessão está aumentando ('a implosão da esfera pública' prevista por Habermas) e que as áreas em que os campos mantem sua própria lógica tendem a diminuir (com a transparência virtual das negociações hoje invisíveis e com a 'politização' de celebridades, atletas e artistas). Vários autores contemporâneos chamam essa convergência de 'espetacularização da política' e consideram que a política tornou-se mais teatral.

O resultado? O crescente desinteresse do público mais informado; o caráter artificial da opinião pública; a perda de autenticidade dos agentes e das instituições de representação política; a substituição parcial dos partidos e das instituições políticas representativas pelos meios de comunicação no debate e na defesa dos interesses da população. E, principalmente, o aumento exponencial do risco (de colapso do sistema político da democracia parlamentar) e a ‘gamificação’ da política, em que os atores disputam as apostas do público.

A democracia gamificada pelo mercado

A convergência entre os campos da comunicação e da política é ainda insuficiente para explicar o fenômeno da gamificação da democracia, surgindo a necessidade “de um terceiro convidado”: o mundo dos negócios (GOMES, 2004,129).

Essa ampliação sociológica extrapola o âmbito da perspectiva discursiva, permitindo um ângulo mais abrangente por um lado. E, por outro, o mercado é quem gamifica a esfera pública e a sociedade civil, investindo na competição de seus agentes. O jogo social é travado agora em três campos: o econômico, o político e o psicocultural. A interação convergente entre a mídia e a poder público promove uma política mais teatral. O mercado reage (a essa aproximação e a apatia política resultante) com a ideia de gamificação da democracia.

Nos anos 90, a ideia de democracia deliberativa - estruturada em um tripé entre o Estado (o campo da igualdade jurídica), o Mercado (o campo desigualdade econômica) e a Sociedade Civil (o campo das comunidades) - será retomada por Anthony Giddens e John B. Thompson. Porém, ao invés de pensar ação socialmente estruturada, os autores contemporâneos pensam em práticas sociais que se reproduzem e não acreditam que na secularização absoluta das tradições, mas que a modernidade convivem com o poder simbólico de modo diferente.

Thompson aponta que os meios de comunicação passaram a mediar a percepção entre tempo e espaço, estabelecendo uma centralidade em relação as outras instituições. A mídia na modernidade sequestrou o 'lugar da fala' da autoridade pública e religiosa. Na pré-modernidade, a informação era distribuída unicamente a partir dos estados e das igrejas. Ao se estabelecerem instituições de mediação com autonomia relativa, o 'monopólio da fala' foi terceirizado. Assim, a mídia é, ao mesmo tempo, um campo para o diálogo entre os atores políticos e o público; e também mais um ator político invisível com interesses próprios em um contexto social mais amplo, que seleciona, hierarquiza e dá visibilidade aos acontecimentos históricos. Os meios de comunicação, assim, desempenham um duplo papel: por um lado, organizam as identidades simbólicas através de narrativas neo-tradicionais; e, por outro, constroem de modo parcial e simplificado a realidade social que contextualiza a vida dos atores visíveis.

Para Giddens, a tradição tradicional é voltada para o passado, para repetição de ciclos históricos; e a modernidade inicia uma nova concepção de tempo espaço em que a reflexividade é voltada para o presente e para o futuro. A modernidade gera ‘bolhas’ tradicionais, mas no geral, produz incerteza pela pluralidade de opções que oferece. Essa falta de certeza e de segurança, aumenta ainda mais a reflexibilidade tanto da simulação de situações de risco como da invenção de ‘novas tradições’ através das mídias. A democracia, assim vista, não é um mito do discurso político, ela é 'a' utopia (o projeto de uma sociedade perfeita sempre inacabada) por excelência. Os mitos estão sempre ancorados no passado imemorial, na tradição, na origem anterior à história; a utopia, ao contrário, está projetada no futuro, em um tempo que ainda não chegou no 'fim da história' (MIGUEL, 2000).

E, no presente, na reflexibilidade moderna, a democracia real é sempre imperfeita e imprevisível, arriscada e contra manipulada pelo poder simbólico. 'Contra manipulada' porque, apesar de parecer anti-tradicional (por apostar no risco, no futuro, na incerteza), a democracia é contextualizada culturalmente por elementos simbólicos. E 'Democracia', lembremos, não apenas como uma forma de governo ou como predomínio formal da maioria, mas como método de tomada de decisões através das regras negociadas entre os diferentes pontos de vista que formam uma unidade de ação. A democracia como método de decisões coletivas implica ainda em levar em considerações os sentimentos, os próprios e os dos outros. A família se des-tradicionalizou, mas também se democratizou emocionalmente. Daí a noção de ‘democracia emocional’, que leva em conta bem estar de si e do outro. O risco produz comportamentos individualistas. Nossa cultura promove o máximo de autonomia dos indivíduos. Desafiamos a morte para nos tornarmos pessoas melhores, com corpos mais capacitados e mentes mais disciplinadas.

Segundo Giddens, a única saída para democracia é se democratizar ainda mais, fazendo com que todos sejam autônomos e responsáveis através de políticas públicas contra a dependência, seja química, familiar, emocional, econômica ou cultural. Porém, quanto mais as pessoas conquistam autonomia individual; menos eles querem participar das decisões coletivas – eis o paradoxo da democracia. Ao mesmo tempo, que a sociedade nos faz mais individualizados, são justamente essas pessoas mais individualizadas (os jovens de maior poder aquisitivo e escolarização, em um primeiro momento, mas é uma tendência que se alastra pela sociedade através da internet) que se recusam a participar da política, considerando-a antidemocrática. O paradoxo da democracia de Giddens é semelhante ao equilíbrio de Nash. Modelo matemático em que apesar dos participantes não cooperarem, é possível que a busca individual da melhor solução conduza o jogo a um resultado estável, não havendo incentivo para mudanças. Ou seja: o governo dos piores, perpetuado pela corrupção e pela omissão dos melhores e da maioria. Sim, porque a baixa participação incentiva que os mais ambiciosos e injustos perdurem.

Conclusão

O discurso político atual se organiza pela gramática específica da linguagem da mídia, com ênfase na novidade, no inusitado e em padrões estéticos. O marketing adapta o discurso político às preferências do público através de pesquisas e se baseia na similitude entre audiência e eleitorado (ou entre a opinião pública e o mercado consumidor). E não se trata apenas do discurso político (mediado), mas a política entendida como prática social passou a se orientar parcialmente pela lógica da visibilidade midiática e de seu capital simbólico.

Entre os analistas que reconhecem a centralidade da mídia na sociedade atual, duas atitudes extremas são possíveis: a que crítica a espetacularização da política, a perda do caráter ideológico do debate político e que a mídia tornou o processo eleitoral em um espetáculo entre outros espetáculos desportivos, culturais e científicos; que os eleitores votam nas imagens dos candidatos (e não mais em suas propostas) e se comportam como se apostassem em jogo de azar - posição mais frequente entre os cientistas políticos. E a atitude que crê em um novo fazer político midiático, acreditando na pureza do diálogo entre eleitores e candidatos e que não há manipulação da mídia - posição típica dos pesquisadores da área de comunicação social.

Para Sartori, a linguagem da televisão, baseada em imagens superficiais e fragmentadas, anula o pensamento crítico, é a Vídeopolítica (2001). A TV está alterando o antropos humano, estamos passando do Homo Sapiens para o Homo-vídeo, em que a representação visual substitui a capacidade de tomar decisões racionais. Sartori lamenta o declínio dos partidos políticos, das plataformas programáticas e o crescente personalismo dos candidatos.

Em contrapartida, existem também os que não acreditam na desfiguração da vida pública, mas sim na emergência de uma nova forma de representação política, com cidadãos mais informados e mais volúveis, dispensando a mediação de partidos políticos. O personalismo crescente, apesar de negativo, é entendido como uma nova forma de agregação das identidades coletivas em um novo contexto social. Precisamos de novos heróis, de protagonistas sociais, de que a mídia faça uma valorização dos agentes políticos. Essa perspectiva é otimista em relação à gamificação da democracia.

Essa perspectiva, no entanto, é completamente utópica. Na verdade, hoje há uma cadeia de realimentação mútua, em que o desinteresse dos eleitores permite o triunfo dos políticos ruins e este triunfo reforça o desencanto do eleitorado. Há um círculo vicioso na política e a democracia representativa tende a se tornar um show sem graça.

Por outro lado, aperfeiçoar a democracia, torná-la mais próxima de seu modelo ideal é uma tarefa permanente e sempre inacabada dos meios de comunicação. Há potencialmente um círculo virtuoso latente, permanentemente disponível para ser executado. A democracia se articula com 'a questão da racionalidade', ou seja: como romper com um equilíbrio indesejável (ou círculo vicioso) e substituí-lo por um equilíbrio auto impositivo justo e equitativo, em que “cada um faça o melhor de si dado o que os outros fazem” e isso resulte em uma otimização crescente do funcionamento deste equilíbrio dinâmico (ou círculo virtuoso).

O certo é que nada acontece 'naturalmente'. A democracia só funcionará através da participação crescente de todos.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. O futuro da Democracia. São Paulo: Paz e Terra, 2000.


_____ Direita e Esquerda. São Paulo: UNESP, 2001.


GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. 1ª ed. São Paulo: Editora UNESP, 1991.


_____ O Mundo em descontrole. RJ: Record, 2003.


GOMES, W. Transformação da Política na era da comunicação de massa. SP: Paulus, 2004.


MIGUEL, L. F. Mito e Discurso Político. 2000. Doutorado em Ciências Políticas. Unicamp, SP.


SARTORI, Giovanni. Homo videns – televisão e pós-pensamento. Bauru, SP: EDUSC, 2001.


THOMPSON, John B. Ideologia e Cultura Moderna. Petrópolis: Vozes, 1995.


______A mídia e a modernidade – uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes, 1998.


_______O escândalo político: poder e visibilidade na era da mídia. Petrópolis: Vozes, 2002.

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