quinta-feira, 28 de julho de 2022

Kerckhove

 McLuhan Pós-moderno ou Revolução Tecnopsicológica

"Os arquitetos de Babel foram punidos por aquilo que os tornava orgulhos: a universalidade de sua linguagem" - comentou Kerckhove pela Internet sobre os atentados terroristas ao World Trade Center. 

Ele, na verdade, retomou um dos temas de seu livro A Pele da Cultura (1997), em que compara o mito bíblico da destruição da Torre de Babel e das muralhas de Jericó com o fenômeno de uma 'catástrofe de software', isto é, de uma implosão da linguagem universal em novos e variados padrões. 

"A overdose de informação é permite visualizar a repetição de um padrão. Não foi apenas um atentado terrorista contra um alvo simbólico do capitalismo, houve uma ruptura com um padrão saturado de ver o mundo. Osana Bin Laden derrubou a crença do ocidente em sua razão materialista".

Desconcertante? Talvez isso seja o mínimo do que se pode dizer das idéias do professor canadense Derrick de Kerckhove, diretor, há mais de vinte anos, do Programa de Cultura e Tecnologia da Universidade de Toronto; aluno-assistente, colaborador e sucessor do pensamento de Marshall McLuhan. Sucessor porque Kerckhove, em vários sentidos, superou o seu mestre tanto em suas qualidades (principalmente na análise da televisão) como em seu estilo fragmentário e aparentemente superficial, cheio de frases de efeito e profecias bombásticas. McLuhan para quem não está lembrado é o autor dos livros 'A Galáxia de Gutenberg' e 'Os meios de comunicação com extensões do homem' e das frases "O meio é a mensagem" e "O mundo será uma aldeia global" (entre outras talvez mais importantes e menos conhecidas como: "A inflação é a falta de identidade do dinheiro" e "Quando a informação se move a uma velocidade elétrica, o mundo das tendências e dos rumores torna-se o mundo 'real'" -  por exemplo). 

E, como dissemos, Kerckhove não fica atrás de seu mestre: para ele, por exemplo, o dinheiro e o alfabeto estão com seus dias contados. É que a desmaterialização da economia, a virtualização cada vez maior dos valores de suas referências físicas, estão, pouco a pouco, substituindo a codificação fonética pela imagem e transformando o dinheiro em informação. 

A ideia de crítica à cultura do alfabeto como uma forma de tecnologia e de um retorno à tecnologia audiovisual através da TV já existia em McLuhan e também, em sua forma reciclada, no pensamento do filósofo francês Pierre Levy (com o qual, aliás, Kerckhove mantém interessante diálogo sobre o conceito de inteligência coletiva). 

Porém, a originalidade de Kerckhove está relacionado à sua genial análise da origem e do destino linguísticos do dinheiro, embutidos em uma simples constatação: "O dinheiro teve na sociedade o mesmo papel do relógio na unidade de processamento do computador - sincronizar todos os cálculos que a máquina faz." 

Ora, se a máquina de sincronia social passa a se reconhecer enquanto tal, ela então não precisa mais de lastro material ou de qualquer tipo de equivalência física: o dinheiro volta a ser informação.

Reparem, porém que, ao contrário do idealismo de McLuhan que sonhava com um futuro próximo utópico, Kerckhove estuda um passado ainda parcialmente presente, uma realidade que não é partilhada por todos e é construída em nome de todos: a Telecracia

E mais: Kerckhove não é, como seu mestre, um entusiasta da globalização. Ele teme a guerra e o nacionalismo. Mas é sobretudo no estudo sobre a televisão que mestre e aluno mais se aproximam e mais se distanciam: ambos descrevem a mídia eletrônica como uma extensão, não só do sistema nervoso e do corpo, mas também da imaginação e da consciência humanas. Para ambos, a TV fala ao corpo e não à mente. 

Sendo que, enquanto McLuhan louva a televisão como uma grande conquista da humanidade, vendo nessa exteriorização do inconsciente social apenas como uma psicopedagogia pública; Kerckhove compreende a mídia eletrônica também como um órgão de controle e análise do corpo social. É um órgão também sujeito a mudanças sociais, pois, para ele, as redes de computadores estão prestes a engolir a televisão e se pulverizar em vários objetos-prótese ligados em rede (roupas, acessórios, veículos, etc). 

Kerckhove observa ainda, devido a esta implosão nanotécnica, a crescente e progressiva perda das fronteiras psicológicas entre o eu e o meio ambiente. Como McLuhan e Levy, ele aponta a Literacia (o império da escrita como modelo social dominante) como a responsável pela 'privatização da mente' e na criação artificial da idéia de um 'eu' individual uniforme; porém Kerckhove crê que com Telecracia e agora com as redes audiovisuais a distinção entre espaço e identidade poderá ruir definitivamente. O ego será politicamente incorreto. 

Assim, os meios de comunicação são extensões do homem, mas o homem também faz parte da máquina social: somos extensões biológicas de um sistema de cognição coletiva, somos apenas a Pele da Cultura: "Eu sou a Terra a olhar para si mesma". E é essa inversão do enfoque original mcluhaniano que faz Kerckhove, não apenas um mero continuador de seu mestre, mas um pensador singular que superou dialeticamente sua maior influência: "A melhor vingança contra as psicotecnologias que nos transformam em extensões delas próprias é incluí-las dentro de nossa psicologia pessoal. Um novo ser humano está a nascer."

Agora  a analogia inicial entre o ataque terrorista ao World Trade Center e o mito da queda da Torre de Babel se explica melhor: longe de apoiar as ações antiamericanas dos extremistas islâmicos, o evento representa, na leitura de Kerckhove, uma passagem decisiva da Literacia para Telecracia, um marco em relação ao desenvolvimento da linguagem humana, em que a imagem em tempo real superou a lógica das palavras e das interpretações.

Resumindo: Derrick de Kerckhove é o mais desconcertante autor contemporâneo e seu livro 'A Pele da Cultura' é, como diz seu ciber-confrade Pierre Levy, "o manifesto da psicotecnologia". 


A Pele da Cultura (Uma investigação sobre a nova realidade eletrônica). Autor: Derrick de Kerckhove. Original: The Skin of Culture (Investigating the New Electronic Reality) foi publicada pela Somerville House Books Limited, Toronto, Ontário, Canadá, em 1995. Tradução portuguesa: Luis Soares e Catarina Carvalho. Coleção Mediações, dirigida por José Bragança de Miranda. Lisboa: Relógio D'Água Editores, março de 1997. 294 páginas.

quarta-feira, 13 de julho de 2022

HISTÓRIA DOS ESTUDOS NARRATIVOS

 

Da Análise Estrutural à Narrativa Mediada




Introdução

Somos feitos de histórias” - pensa o historiador, da mesma forma que o biólogo acha que somos feitos de células e que o físico entende que somos feitos de átomos. Cada qual com sua narrativa, porque somos feitos de narrativas. Nossa identidade e nossa memória dependem da narrativa que contamos. Sim, você acertou: digo que somos feitos de narrativas porque sou um contador de histórias. E não me sinto melhor que o historiador, o biólogo ou o físico. Somos iguais, apenas com pontos de vista diferentes. Como esse ponto de vista tornou-se capaz de explicar e compreender outros sem contradizê-los? O que é narrativa? E por que a noção de narrativa tornou-se tão importante em nossos dias? Essas são as questões que desejamos responder aqui.

O objetivo principal é revisar as abordagens voltadas para o estudo das narrativas orais e escritas, observando como as narrativas audiovisuais assimilam suas antecessoras e apresentando algumas metodologias de análise capazes de entendê-las e explicá-las. O presente texto revisa os principais autores associados aos estudos narrativos: Propp (1978), Campbell (1990, 1995), Levi-Strauss (1996, 2004; 2005; 2006; 2011), Greimas (1973), Umberto Eco (1993), Roland Barthes (1971, 1972, 1977a, 1977b, 19080, 2004), Paul Riceur ( 1994; 1995; 1997), John Thompson (1995) e Motta (2013).

  1. Aristóteles, Propp e Campbell

Os conceitos de Aristóteles são utilizados ainda hoje. A noção de ‘catarse’, por exemplo, é a purgação e esclarecimento, sofrimento sentido por nós projetarmos em situações dolorosas simuladas, que nos causam alívio e bem estar. Ou ainda ‘Intriga’, o agenciamento de fatos, sujeitos e cenários segundo o desfecho desejado. Há também a dialética entre Mimese e Diegesis, cujo significado varia bastante segundo o autor.

De forma geral, enquanto a Mimese é associada a ‘Narrar’; a Diegesis é relacionada ao ‘Mostrar’. Então, para senso comum, os elementos diegéticos são aqueles extra narrativos, como a trilha sonora de um filme. Em uma perspectiva mais teórica, no entanto, a Mimese é a imitação criativa ou representação interpretativa da ação, através do qual aprendemos atitudes, comportamentos e nos comunicamos; e a Diegesis, o contexto narrativo em que a Mimese se realiza, o espaço-tempo em que o evento e suas repetições acontecem.

Dando sequência às reflexões de Aristóteles sobre a arte de contar histórias, Vladimir Propp escreveu a Morfologia do Conto Maravilhoso (1978). Estudando um recorte bem específico (cem contos de fadas russos orais), o estudioso descobriu uma possível estrutura genérica da narrativa. Propp identificou sete classes de personagens (agentes), seis estágios de evolução da narrativa e 31 funções narrativas das situações dramáticas. Os seis estágios de evolução da narrativa (Situação inicial, Conflito, Desenvolvimento do Conflito, Clímax, Solução do Conflito e Encerramento) foram complexificados por outros autores. E os sete agentes - o agressor; o doador do objeto mágico ao herói; o auxiliar do herói; a Princesa e o Pai (não obrigatoriamente o Rei ou a princesa, elemento sequestrado pelo vilão); o Mandador; o Herói; e o falso herói – são definidos por suas ações, sem traços pessoais ou profundidade psicológica.

Propp utilizava seus conceitos para descrever as narrativas específicas e não para prescrever uma tipologia ou modelo geral. Sua contribuição mais importante foi decompor a narrativa em 31 funções dramáticas possíveis1. Mas, essas funções narrativas em seu conjunto não formavam ainda uma estrutura e sim uma arqueologia. Por isso, é considerado um 'formalista', pré-estruturalista. Sua contribuição principal é decompor as histórias orais em funções e em ações dos agentes, facilitando sua comparação.

Outra contribuição relevante foi a de Joseph Campbell (1990, 19952). Ele levou as ideias de Jung aos campos da arqueologia, antropologia e história das religiões, elaborando um modelo segundo o qual todos os grandes mitos fundadores das culturas humanas seriam, em última análise, uma única narrativa universal: o 'monomito', também chamado de “Jornada do Herói”, em que o protagonista abandona a vida ordinária, mergulha no desconhecido e retorna à dimensão cotidiana. O modelo é composto de 3 fases e 17 momentos. E todas as histórias heróicas são na verdade a repetição dessa única estrutura narrativa.

O roteirista Christopher Vogler (1997) usou as teorias de Campbell para criar um memorando para os estúdios Disney. Vogler faz uma adaptação reduzida da jornada de Campbell, mantendo as três fases narrativas e reduzindo as 17 etapas para apenas 12. Hoje esse modelo narrativo é referência para produção de vários filmes, romances, histórias em quadrinhos e narrativas heróicas. E também para análise dessas narrativas. Porém, além da redução, o protocolo Vogler usa a estrutura da jornada como um modelo de organização das narrativas, completamente dissociado da observação psicológica e do desenvolvimento pessoal de si próprio.

Campbell, além descrever as narrativas de Buda, Moisés e Cristo em termos do monomito; também acreditava na jornada como um rito de passagem da infância para a responsabilidade comunitária, como um processo pelo qual todos passamos, mesmo que involuntariamente. Principalmente agora, que a sociedade enfatiza o risco para engendrar aventuras, todos são heróis em jornada "de iniciação" em sua trajetória do anonimato à consagração (GOMES 2022).

Figura 1 – A Jornada do Herói

Fonte: Internet

Os 12 Estágios da Jornada do Herói3

1. Mundo Comum – O primeiro estágio forma o ambiente normal, onde o herói vive junto a outras pessoas, antes de iniciar sua grande aventura.

2. A Chamada – Aqui um desafio surge e acaba influenciando o herói a sair de sua zona de conforto para cumprir um problema.

3. Recusa ou Reticência – O personagem tende a recusar ou demorar a aceitar a chamada, resistindo a ‘entrar na dança’. Quase sempre é porque tem medo, sente-se inseguro ou incapaz.

4. Mentoria – No quarto estágio ele se encontra com um mentor, sábio, oráculo; recebe uma ajuda divina ou sobrenatural que o motiva a aceitar a chamada, concedendo-lhe o conhecimento e a sabedoria para encarar a aventura.

5. Cruzamento do Primeiro Portal – Onde o herói emerge do mundo comum e ultrapassa um portal que leva a um mundo especial, mágico, uma outra dimensão.

6. Provações, aliados e inimigos – No sexto estágio, o personagem passa por testes, enfrenta problemas, incógnitas surgem. Nesta etapa ele também encontra aliados e enfrenta inimigos e acaba aprendendo as regras do novo mundo.

7. Aproximação – O herói vence as provações.

8. Provação difícil ou traumática – A maior dificuldade da aventura aparece, como um caso de vida ou morte. Esta é a parte mais dolorida do enredo.

9. Recompensa – O personagem escapa do fim trágico, supera o medo e adquire a fórmula mágica, a recompensa por ter aceitado o desafio.

10. O Retorno – Retorna para o mundo comum, volta ao ponto de partida.

11. Ressurreição – Outro momento decisivo na vida do personagem, mais um teste ao qual ele enfrenta o perigo, a morte e deve usar com veemência tudo que foi aprendido, inclusive a fórmula mágica.

12. Regresso com a fórmula – Volta para casa com a fórmula de ajudar a todos de seu mundo comum.


Campbell e seus seguidores partem do geral (do 'inconsciente coletivo', dos 'arquétipos') ao particular (o mito cultural específico), são universalistas e cultuam o sagrado como uma epifania transcultural. Enquanto Propp e as abordagens estruturalistas, no sentido contrário, observam o aspecto local do mito e da narrativa dentro de um quadro de referências globais. Ambos abordam 'o todo e as partes' – de modo até complementar em alguns aspectos.

  1. Lévi-strauss

Aliando o formalismo narrativo de Propp ao caráter estruturante dos mitos em cada contexto cultural (enfatizado por Campell), as análises de Claude Lévi-Strauss comparam a mitologia a uma sinfonia musical, em que a melodia corresponde ao eixo sintagmático (a sucessão de notas no tempo contínuo) e a harmonia ao eixo paradigmático (notas simultâneas dentro de um acorde). E esta analogia permite ao antropólogo pensar em uma gramática universal do mito: a passagem da natureza à cultura (do crú ao cozido, do nú ao vestido, etc), o estabelecimento de regras de aliança e a separação entre humanos e não humanos.

Após, investigar durante 20 anos diferentes culturas ameríndias, realizando uma ampla a análise estrutural de 813 mitos nativos das duas Américas com algumas variantes; Lévi-Strauss publicou o maior e mais completo estudo sobre o mito do herói (2004; 2005; 2006; 2011).

Há também um livro autobiográfico, sem análises antropológicas, organizado a partir de seu diário de campo no Brasil, Tristes Trópicos (1996), que relata sua experiência como uma jornada mítica, como uma viagem intercultural de autoconhecimento.

O mito de referência (M1) é o ‘desaninhador de pássaros’, que serve como fio condutor de todas as análises que se seguem. A narrativa foi colhida pelo próprio Lévi-Strauss quando esteve no Brasil, estudando os índios Bororo do Mato Grosso e conta a história de um incesto materno.

Ao descobrir a transgressão, o pai expulsa o filho. O herói vai para dimensões desconhecidas e rouba o fogo de seres mágicos. Em algumas dessas lendas, o fogo é dado em troca de uma aliança e de um casamento do herói nativo com a filha de seres encantados. Então, dono de grande poder, volta à sua terra e mata o pai, a mãe e todos que o humilharam no passado. O mito assim tanto prescreve o tabu como sua transgressão heroica e destrutiva. Esses transgressores dos limites entre natureza e cultura estão destinados a se tornarem senhores do fogo e da guerra4.

A estrutura do M1 tem quatro momentos: a transgressão do tabu (o pecado original), o castigo social (a expulsão do paraíso), a conquista do fogo (a plenitude da liberdade) e a vingança da exclusão através da destruição generalizada (o apocalipse).

Essa 'armadura narrativa' é comparada com outras narrativas míticas ressaltando suas variações e pontos em comum: Em O cru e o cozido (2004) e em Do mel às cinzas (2005)5 são baseados em metáforas culinárias em torno do mito do fogo sulamericano; A origem dos modos à mesa (2006) e o Homem nú (2011) ampliam a perspectiva de Strauss para outras áreas culturais como o vestimentos e os costumes em geral, na mitologia dos nativos norte-americana.

Para Lévi-Strauss o mito é uma representação formada simultaneamente por três códigos de troca interdependentes: a economia-política (a troca de bens), a linguística (a troca de signos) e o parentesco (a troca de mulheres, na verdade a história de permuta genética entre famílias). Os mitos, assim, expressam esses três aspectos: a divisão social do trabalho justificando as relações de poder e exploração entre grupos; a linguística explicando os nomes das pessoas, coisas e locais; e o parentesco, não apenas legitimando as diferenças étnicas entre povos, mas, sobretudo reproduzindo de um modelo de trocas sexuais, com seus interditos e sublimações.

Aperfeiçoando a noção de estrutura social, como um modelo de múltiplas determinações das relações sociais, Lévi-Strauss critica seus antecessores por verem nos discursos e nas ações individuais meras execuções da estrutura social e não seu núcleo cognitivo. Jackobson pensou em uma linguística estrutural em que a fala fosse mais relevante que a língua.

Lévi-Strauss adaptou essa ênfase a ação social e a estrutura. De forma que, para ele, a possibilidade de uma ação individual se exercer se encontra estruturalmente determinada sem que disto decorra uma obediência cega e inconsciente às regras sociais como em Saussure e na maioria dos estruturalistas; nem que, ao contrário, se caia em uma atitude deliberada e intencional, idealista .

O outro ponto é referente ao sistema de parentesco (e às ideias de inconsciente e de recalque dos desejos de Freud). Enquanto Freud crê no complexo de Édipo e na sublimação dos instintos, Lévi-Strauss prefere descrever o tabu do incesto matrilinear como o centro de um sistema de recorrências involuntárias que tem como estrutura a perpetuação das relações de parentesco. Neste modelo, a Natureza é o universal, o espontâneo e o inconsciente; enquanto a Cultura corresponde ao conjunto das regras relativas e particulares. Há diversas culturas e uma única natureza. O incesto matrilinear é a única regra universal para todas as culturas, epicentro das relações dos homens com seu ambiente. Por isso, os mitos têm um conteúdo universal.

Apesar de ser um formalismo a-histórico, duplamente sem sujeito (sem agentes sociais nem auto referência de observação), o estruturalismo foi uma dupla reviravolta contra o etnocentrismo científico e o relativismo cultural, formando um inventário metódico do drama universal do homem em suas culturas.

Lévi-Strauss, Lacan, Bourdieu, Foucault, Barthes, Greimas – toda geração de pensadores franceses do pós-guerra, amigos entre si - fazem uma transição gradual do estruturalismo (e da morte do sujeito universal) para a pós-modernidade, caracterizada pela auto referência discursiva do enunciador, pela observação intersubjetiva, pela emergência do receptor ativo. Cada um faz essa passagem de uma forma diversa, em áreas diferentes do conhecimento, com variados percursos e perspectivas. Todos, no entanto, descobriram o próprio protagonismo frente às estruturas, sendo mais propositivos que analíticos, virando definitivamente essa página da história da teoria narrativa.

  1. Semiótica narrativa

Greimas escreveu um artigo (BARTHES et alli, 2008, 63) em que retoma o método de análise mítica de Levi-Strauss e o mito do desaninhador de pássaros, para pensá-lo do ponto de vista da semântica. Na semântica estrutural de Greimas não há uma única estrutura fixa e atemporal integrando diferentes sistemas de troca, mas sim várias estruturas diferentes sobrepostas: a estrutura linguística de superfície, a estrutura discursiva intermediária (as formas de conteúdo); a estrutura narrativa de profundidade (a substância de conteúdo, o simbólico, os universais do imaginário).

Figura 2 – Análises linguística, discursiva e narrativa

Assim, a linguagem (ou a estrutura linguística de superfície) é: sincrônica e imediata, sendo explicada pela análise discursiva no plano das formas de conteúdo (pelos enunciados diacrônicos e lineares do pensamento) e pela análise da estrutura narrativa de profundidade, o arranjo dos elementos universais e inconscientes (que voltam a ser simultâneos).

Ferdinand Saussure, criador da linguística e do estruturalismo, estabeleceu o Signo como unidade mínima da linguagem e o subdividiu em dois aspectos indissociáveis: o Significante ou aspecto material (uma “imagem acústica”); e Significado ou aspecto mental (a ideia abstrata que o signo representa).

Enquanto Saussure elaborou uma linguística voltada para o estudo oral do idioma, Hjelmslev e a escola glossemática criaram uma linguística estruturalista voltada para o idioma escrito e duplicaram a dicotomia do signo em quatro níveis: Forma de Expressão, Substância de Expressão (referentes ao Significante e ao aspecto exterior da linguagem), Forma de Conteúdo e Substância de Conteúdo (relativas ao Significado e ao aspecto interior da linguagem).





Tabela 1 – Saussure e Hjelmslev

SAUSSURE

GLOSSEMÁTICA

SIGNO

SIGNIFICANTE

Imagem acústica

Forma de Expressão

Ordem de elementos

Substância de Expressão

Morfemas elementos

SIGNIFICADO

Ideia abstrata

Forma de Conteúdo

Ordem estrutural

Substância de Conteúdo

Conceito puro



Chapman e depois Greimas utilizam o modelo dos quatro níveis da linguagem da escola glossemática para estudar narrativas.

  • A forma de expressão é a linguagem superficial, imediata, como a percebemos através dos sentidos. Ela é composta com palavras, imagens, sons e signos materiais.

  • A substância de expressão é o significado imediato, temático, do conteúdo de cada signo: o que foi dito e onde/quando foi dito. A linguagem transforma-se em discurso, um conjunto de enunciados.

  • A forma de conteúdo, por sua vez, implica em se observar o contexto de enunciação e os diversos contextos de recepção (os diferentes pactos de leitura da narrativa), fazendo assim uma crítica ideológica da narrativa. A forma de conteúdo também pode ser compreendida como uma crítica estética, destacando como a narrativa se coloca em relação a outras narrativas semelhantes em gênero ou tipo, se assimila enredos de outras histórias ou se traz elementos novos.

  • A substância de conteúdo se refere aos elementos simbólicos e psicológicos da narrativa, aos ‘universais do imaginário’, que combinados de diferentes modos formam a “mensagem” da narrativa. Greimas sugere a organização desses elementos em pares, representando os conflitos, relações complementares e contrapontos da narrativa, em modelo chamado de Quadrado Semiótico Narrativo. Este modelo consiste em definir quatro actantes (ou elementos simbólicos principais da narrativa e organizá-los em seis pares de opostos.

Para Greimas, todo texto pode ser analisado como uma narrativa. Por exemplo: o médico lê os sintomas de seu paciente (no plano das formas de expressão) extraindo daí um diagnóstico (no plano do conteúdo de substância) de sua enfermidade. Os sintomas são os significantes e o diagnóstico é o significado. Todo sistema semiótico narrativo é formado por uma semântica (estudo dos significados) e por uma sintaxe (estudo das relações estruturais entre os significantes).

A forma de expressão é a linguagem superficial, imediata, como a percebemos através dos sentidos. Ela é composta com palavras, imagens, sons, signos materiais. Já a substância de expressão é o significado imediato, temático, do conteúdo de cada signo: o que foi dito e onde/quando foi dito. A linguagem transforma-se em discurso, um conjunto de enunciados.

Os sintomas-significantes ‘seios inchados e doloridos, atraso na menstruação, enjoos, alterações no paladar’ no plano da forma de expressão nos leva a enunciar o diagnóstico-significado de ‘gravidez’ no plano da substância de expressão.

Nas narrativas no nível das formas de conteúdo, alguém (O SUJEITO) deseja alcançar algo (O OBJETO DE VALOR) e é atrapalhado por algo/alguém (O ANTI SUJEITO). Este modelo simples permite entender o gênero (que tipo de objeto de valor) e a ideologia (a identidade do anti sujeito) da narrativa. No caso da gravidez, o diagnóstico da substância de expressão: a mãe é o actante sujeito; a futura criança, o objeto de valor; e o anti sujeito, define o tipo de narrativa: gravidez de risco, gravidez indesejada, gravidez constrangedora.

E, finalmente, em nosso exemplo, chegamos aos conteúdos mais simbólicos e universais envolvendo a gravidez e o parto como ritos de passagem feminino. A substância de conteúdo se refere aos elementos simbólicos e psicológicos da narrativa, aos ‘universais do imaginário’, que combinados de diferentes modos formam a “mensagem” da narrativa.

Greimas sugere a organização desses elementos em pares, representando os conflitos, relações complementares e contrapontos da narrativa, em modelo chamado de Quadrado Semiótico Narrativo. Este modelo consiste em definir quatro actantes (sujeito, anti-sujeito, objeto de valor e ajudante) e organizá-los em pares de opostos: duas relações de contradição; duas relações de contrariedade; e duas relações de complementaridade.

O Quadrado Semiótico Narrativo de Greimas consiste na representação visual da articulação lógica de uma qualquer categoria semântica no plano de conteúdo. Nele, se situam os actantes: o Sujeito (S1), o Ajudante (S2), o Objeto de Valor (~S1) e o Anti-sujeito (~S2). As linhas bidirecionais contínuas representam as relações de contradição; as bidirecionais tracejadas, as relações de contrariedade; e as linhas unidirecionais, as relações de complementaridade.

Geralmente apresenta-se Greimas como um teórico estruturalista que superou o estruturalismo, mas isso não é inteiramente verdade. Seu livro mais importante, Semântica estrutural (1973), já considera as raízes psicológicas da linguagem. E os livros posteriores Semiótica das paixões (1993) e Da Imperfeição (2002) tratam de compreender as emoções e os efeitos de sentido do receptor e não mais a análise linguística das narrativas, porém não abandonam inteiramente sua perspectiva estrutural.

  1. Os limites da interpretação

Walter Benjamin em A Obra de Arte na era de sua reprodutividade técnica (1985, 5-28) ressalta o impacto que a produção em série de objetos pela indústria teve sobre a percepção. Houve um tempo em que apenas as moedas e a xilogravura eram objetos produzidos em série. A obra de arte era única no tempo e no espaço e isso lhe conferia uma aura, uma presença sagrada. Hoje praticamente tudo é reproduzido de modo idêntico. A arte, então, deixou de ser sagrada, 'objeto de culto' para se tornar expressiva dos sentimentos e crítica da injustiça social.

Em O Narrador (1985, p. 57-74), Benjamin observa que, com a reprodutividade técnica, também há uma mudança na forma ‘como’ contamos histórias. Para ele, as histórias orais eram míticas, encantadas, tinham um efeito de sentido mágico. E a narratividade do romance moderno é desencantada, descritiva e propositalmente subjetiva.

No ambiente tradicional, as histórias eram transmitidas oralmente e, portanto, eram repetidas sempre da mesma forma – como exigem as crianças em seus primeiros anos. Quando ganhavam versões escritas, os narradores não se assumiram como autores da narrativa: Homero, Virgílio, Apuleio apenas recontavam narrativas que ouviram. A ênfase cognitiva era na narrativa.

No ambiente moderno, no entanto, o contador de histórias (escritores, cineastas, artistas) deve ‘ser criativo’, original e primar pela novidade, não só contando uma mesma história de diferentes formas, mas sempre contando novas histórias. Tornou-se lugar comum não apenas recontar histórias clássicas com um estilo autoral, mas também combinar histórias de diferentes culturas e épocas, relacionando-as, misturando seus personagens e textos, fazendo citações para serem reconhecidas. A ênfase moderna é no narrador.

Em outros textos (1985, 29-56), Benjamin diz que o artista moderno é sagrado, é ele que tem a 'áurea', que é sua vida que dá sentido à sua obra. Para ele, a produção em série deslocou a singularidade da arte do campo do objeto para o interior do sujeito, transformando a ‘espiritualidade da criação’ na ‘genialidade do criador’. Esta ditadura do emissor instaurou a relação explícita entre o enunciador e a referência (dividindo as narrativas entre reais e imaginárias) e instaurando a metalinguagem no coração da arte moderna. A imagem e os sentimentos foram secundarizados no significante.

Porém, ao contrário do que pensou Benjamin, a morte da narrativa como prática social não aconteceu com a educação iluminista, as narrativas não se desencantaram por completo com a unilateralidade dos textos escritos. A interpretação de um texto se constitui num processo aberto e cooperativo entre autor-texto-leitor. Durante muito tempo a crítica literária acreditava que o sentido de um texto era a expressão das intenções de seu autor. Ao leitor, caberia apenas o papel passivo de interpretar o que o autor quis dizer.

Charles Sanders Peirce (2003) entende que o sentido é produzido mais pela relação texto-receptor do que pela intenção do enunciador (psicanálise) e/ou do significado do texto em si (estruturalismo). A ‘semiose ilimitada’ a partir do interpretante significa que um signo não representa um objeto de referência e sim outro signo, que representa outro signo e assim indefinidamente. Nesse contexto, a ênfase narrativa principal é no leitor e na própria percepção.

Mesmo aceitando a semiose ilimitada do receptor, Interpretação e superinterpretação (ECO 1993) traça limites para interpretação através da noção de leitor-modelo. Para Eco, há textos abertos como a arte (polissêmicos, em que vários sentidos convergentes se encaixam) e textos fechados, dirigidos a públicos específicos. Para entender textos intermediários, Eco propõe duas estratégias de interpretação textual: o autor-modelo e o leitor-modelo.

E como teórico da comunicação, Eco restringe a semiose ilimitada à semiótica, enquadrado pelo campo sociológico. Apesar de reconhecer a importância da interpretação final do receptor, Eco destaca o peso das circunstâncias de enunciação {...} “do que está atrás do texto, atrás do destinatário e provavelmente diante do texto e do processo de cooperação (no sentido de que depende da pergunta: ‘Que quero fazer com este texto?’)” (ECO, 1993, p. 49).

Ao contrário de outros defensores da semiose ilimitada perciana (como Jacques Derrida e Richard Rorty), Umberto Eco leva em conta o contexto do enunciador (ou o contexto sócio histórico de transmissão e distribuição do discurso e os ‘pactos de leitura’ (os diferentes contextos sócio culturais de recepção do discurso).

As estratégias de leitura textual (o autor modelo e os leitores modelos) seriam os limites da interpretação legítima. O texto quando tem uma única interpretação fechada tende a paráfrase e ao autor-ideal e quando tem muitas possibilidades de sentido tende à abertura, à polissemia e aos leitores-ideais. Na prática, a maioria dos textos está entre esses extremos. Enquanto, os defensores da semiose ilimitada absoluta estariam endossando projeções indevidas, ‘usos’ arbitrários e ‘super-interpretações’. O autor-ideal e os leitores-ideais operam como estruturas dentro da semiose do receptor. Há a narratividade do emissor (o repórter fazendo uma matéria), narratividade da linguagem (o editor que reorganiza o trabalho do repórter), mas, o mais importante, é a narratividade do telespectador, que ‘zapeia’ os canais com seu controle remoto.

Daqui se depreende alguns pontos importantes: a) a intriga principal de uma narrativa é tecido por quem a escuta (como um sonho que lembramos de trás para frente e que Freud chama de processo elaboração secundária); b) com a semiose do receptor sendo primária, há uma inversão na ordem metodológica de analisar narrativas; c) o contexto do emissor (ou autor-ideal) e a linguagem da narrativa são limites para interpretação não ser arbitrária; e d) que a seleção das narrativas e dos enredos que nos interessam são orientados pelos nossos afetos e ideias.

Assim, procuramos, ouvimos e recontamos histórias para e por nos identificar com elas. Desejamos a vingança do herói injustiçado para compensar nossas humilhações pessoais; escolhemos o herói sofredor para redimir nosso sofrimento através da catarse trágica; rimos e achamos graça dos anti-heróis para esquecer do mundo; temos simpatia piedosa pelos protagonistas imperfeitos; e, sobretudo, cultuamos comportamento exemplares através de heróis perfeitos. Escolhemos torcer por time ou por um jogador não só porque queremos ganhar com ele, mas sobretudo porque ele nos representa em aspectos subjetivos.

Tabela – Identidade afetiva entre protagonista e receptor

Tipo de protagonista

Modo de identificação

Disposição do receptor

Competidor

Qualidades pessoais

Apostar no vencedor

Herói perfeito

Admiração

Culto ao comportamento exemplar

Herói imperfeito

Piedade

Simpatia, interesse moral

Anti-herói

Irônica

Espanto, provocação cômica

Herói que sofre

Catártica trágica

Redenção do sofrimento pessoal

Herói injustiçado

Catártica vingativa

Compensação das humilhações

Adaptado a partir de Jauss apud Motta (2013, 189)

Mas há também identificações indiretas. 'Herói' é o protagonista que faz coisas erradas pelos motivos certos. Quebra regras morais e culturais por motivação ética. Há também os 'pseudo heróis' (um dos agentes de Propp), que são os personagens que fazem coisas certas pelos motivos errados. Fazem o bem para serem reconhecidos, por vaidade ou por inveja do verdadeiro herói. Nas narrativas de super-heróis a disputa entre heróis e pseudo heróis é um lugar comum, frente aos vilões, aqueles que fazem coisas erradas pelos motivos errados.

A questão é o dilema moral entre matar o vilão ou entregá-lo à justiça. Muitos super-heróis, principalmente os vigilantes, têm narrativas que discutem a diferença ética entre justiça e vingança. A identificação afetiva entre protagonista e leitor, nesse caso, é indireta: o leitor também é invejado por outros e por isso se identifica com o 'herói verdadeiro'.

  1. Semeologia e narratologia

A coletânea de artigos Análise Estrutural da Narrativa (BARTHES et alli, 2008)6 marca um momento importante para os estudos narrativos em seu momento estruturalista. Umberto Eco escreve uma análise narrativa dos livros de James Bond (2008, 142); Claude Bremond investiga 'A lógica dos possíveis narrativos' (2008, 114); Tzvetan Todorov define 'As categorias da narrativa literária' (2008, 218); Gérard Genette discute as Fronteiras da narrativa (2008, 265), voltando aos conceitos de mimesis e diegesis em Platão e Aristóteles; Greimas faz uma já citada homenagem ao trabalho de Lévi-Strauss em Elementos para uma teoria da interpretação da narrativa mítica (2008, 63); e Roland Barthes, organizador do livro, publica sua panorâmica Introdução à análise estrutural da narrativa (2008, 19) - em que a noção de narrativa como unidade sintagmática é operacionalmente decomposta em ações (unidades intermediárias) e essas em funções (unidades primárias). Barthes também observa as vozes do autor, da mensagem e do leitor na narrativa.

Ao contrário de Campbell, de Lévi-Strauss e de Greimas, que viam as narrativas míticas como epifanias e memórias estruturantes; Roland Barthes considera que os mitos são construções ideológicas do poder conotativo. O mito naturaliza as relações sociais, transformando contingências históricas em tabus e falsas identidades, eternizando o mundo em suas desigualdades.

O livro Mitologias (BARTHES, 1972) - escrito nos anos 50, com textos rápidos, muitos dos quais publicados em jornais, com críticas estruturalistas a temas comuns da mídia (o Citroën DS, a luta livre, o vinho, o rosto de Greta Garbo, as batatas fritas e os fait divers) popularizou rapidamente o autor fora no meio acadêmico francês, inclusive fora do país. Segundo Barthes, o senso comum é a linguagem denotativa; e a verdade desmascarada é a linguagem conotativa. E, para ele, o papel do crítico é desconstruir o denotativo mostrando o conotativo.

Aqui no Brasil, em virtude das preferências intelectuais de tradutores e editores, temos dois Barthes diferentes:

(…) nos anos 70, foi sobretudo o autor estruturalista que interessou aos intelectuais brasileiros, graças a suas reflexões sobre a linguagem, calcadas nas teorias linguísticas em voga (…) transformaram-se nas leituras obrigatórias ao intelectual interessado em analisar qualquer tipo de linguagem, da literatura ao cinema, do mobiliário às revistas em quadrinhos, da moda à publicidade, da fotografia ao discurso jornalístico. O Roland Barthes que ora transparecia era o semiólogo, líder do estruturalismo francês, instrumental analítico, pau para toda obra, teoria para toda pesquisa. (…) Mas a pós-modernidade do final dos anos 90 e do início dos anos 2000 ressuscitou o escritor como um todo, reconhecendo nele um precursor de modelos libertários de construção literária: a estética do fragmento e a escrita corpórea, que opera guiada pelo desejo, por exemplo, foram celebradas como formas de ruptura com o padrão de escrita acadêmica, em princípio objetiva e fundamentada em uma lógica puramente racional.7

O grande marco dessa virada foi a aula inaugural no College de France, em 1977, quando Barthes rompeu definitivamente com o estruturalismo, ao considerar a língua como um código de linguagem engendrado pelo poder (e não como memória social), aproximando-se de Foucault. Barthes tem um percurso que vai da linguística estrutural à literatura, embora parte de seus leitores minimizem essa mudança.

O certo, no entanto, é que seus livros mais recentes são bem diferentes dos mais antigos. O Roland Barthes estruturalista do Sistema da moda, da Introdução a análise estrutural da narrativa, do Grau zero da Escritura e de Elementos de Semiologia (1971b) não é o mesmo Roland Barthes pós-moderno dos livros Fragmentos do Discurso Amoroso (1977), um dicionário de verbetes filosóficos sobre o amor; Camera Clara (1980), um estudo sobre fotografia e morte.

Há também textos de transição como A Morte do Autor (2004), escrito dez anos antes da Aula de 1977. A morte do autor é na verdade o nascimento do leitor e é considerado um marco de superação do estruturalismo (para quem o autor já não importava).

Em seus primeiros livros, Barthes enfatiza mais o significado que o significante, que confunde com o aspecto material do signo, chegando a dizer que a semiologia deveria ser uma parte da linguística (e não o contrário como pensam Saussure e Peirce) devido ao predomínio do verbal sobre não verbal. Ele combatia a noção de um 'significante transcendental' e do conceito de símbolo na tradição freudiana. Assim, o significante é material e haveriam sempre dois significados, o denotativo e o conotativo. Por exemplo: um conjunto de significantes (luvas, gorro, casaco) tem como significado denotativo 'o frio' e como significado conotativo, a condição social do portador.

Particularmente, considero essa incapacidade de entender o papel cognitivo da imagem, da entonação de voz e dos símbolos em real uma 'misogenia linguística'. Porém, compreendo que muitos ainda continuem pensando assim. Além disso, a verdade é que há uma grande diferença entre analisar narrativas e interpretar a própria história. Os últimos textos de Barthes são um convite à ruptura de um paradigma e à superação de um modo de vida através de uma nova atitude diante do mundo. Mas, só alguns percebem: Barthes não é mais um analista, tornou-se um escritor (ou um scriptor, como preferia).

  1. A hermenêutica narrativa

A hermenêutica é a teoria da interpretação dos discursos e é utilizada em diferentes áreas do conhecimento, no Direito e nos estudos bíblicos. Ela é conhecida pela capacidade de assimilação de outros saberes, pela combinação de métodos e de teorias em nome da compreensão. Paul Ricoeur é o grande codificador contemporâneo da hermenêutica filosófica, combinando as teorias psicanalítica, estruturalista e fenomenológica. Ricoeur também é o marco de divisão entre a narratogia estruturalista (que tinha por objetivo descrever e explicar) para os estudos narrativos compreensivos, em que as narrativas nos dizem que somos e nos ensinam a resolver nossos problemas. A narrativa agora é vista como processo cultural é centrada na narração ou na enunciação narrativa, mais do que na narrativa em si. Enquanto o círculo de recorrência semiótica se limita ao mundo dos interlocutores através do discurso, o círculo hermenêutico comporta ainda a presença de outros agentes e objetos em um universo mais vasto e aberto a influências inesperadas. O enunciado não é mais imposto pela codificação do enunciador, mas produzido e compartilhado semioticamente pelos interlocutores dentro de um contexto hermenêutico mais amplo. Abre-se uma perspectiva mais cultural e antropológica do que linguística, mais fenomenológica que estrutural.

Tempo e Narrativa (RICOEUR: 1994; 1995; 1997)8 absorve Aristóteles, o estruturalismo, a mitologia e a tese da semiose ilimitada para mostrar que a historiografia (a narrativa dos historiadores) é uma construção poética. Constata que não há diferenças estruturais entre as narrativas reais e as imaginárias. A diferença entre as narrativas reais e as ficcionais são as provas, as fontes, as evidências comprovadas. E, claro, o pacto de leitura. O leitor sabe de antemão se o texto se refere a acontecimentos reais ou se tem licença poética para inventar situações e ações, que, indiretamente, transmitam a realidade ou destaque elementos discretos.

Narrar história é enredar pessoas, instituições e ideias, é também enredar-se como narrador – seja em textos científicos ou jornalísticos. A noção de intriga passa a ser utilizado, não apenas como a coluna vertebral da narrativa, mas, principalmente, como a configuração invertida das mimesis do autor, da linguagem e dos leitores. Invertida porque, de forma semelhante ao processo de elaboração secundárias dos sonhos de Freud, organiza a narrativa de trás para frente, sempre a partir da última percepção do receptor, elegendo aliados e vilões, criando ganchos de suspense, viradas e surpresas para enganar o leitor.

Thompson (1995) aplica as ideias de Ricoeur ao aspecto simbólico das narrativas mediadas. Mas há uma diferença marcante entre a hermenêutica clássica e a de Thompson. Os hermeneutas clássicos dão mais ênfase ao ‘texto’, isto é, ao significado intrínseco da linguagem, do que às condições de enunciação e de apropriação desse sentido. E, por ser sociólogo, para Thompson, a ‘autonomia semântica das mensagens’ (e sua análise independentemente dos interlocutores) é secundária diante dos contextos sócio-históricos de transmissão e de recepção.

Para ele, os contextos fazem parte da narrativa e do seu aspecto ideológico. Thompson define ideologia como “uma forma simbólica que está a serviço do poder”, deixando claro que existem outras formas simbólicas que não cumprem esse papel, ou mesmo que ideologia é apenas uma das formas de interpretação possíveis de uma determinada forma simbólica. A ideologia não está apenas no contexto de quem diz, também não apenas no como se diz, mas, principalmente, no que se compreende. Thompson parte da compreensão imediata que se tem de uma determinada narrativa ou forma simbólica na vida cotidiana, depois busca construir uma concepção objetiva explicativa dessa interpretação preliminar (consorciando vários métodos de análise) e, finalmente, reinterpreta o significado da narrativa através de outras interpretações diferentes.

A esta metodologia geral, chama-se “enfoque tríplice”. (THOMPSON, 1995, p. 355)

Tabela 3 – Metodologia Triplice

OBJETO

ETAPAS

MÉTODOS CONJUGADOS

RESULTADO

Emissor

Análise sócio-histórica da produção e transmissão

Situações espaço-temporais

Campos de interação

Instituições Sociais

Estrutura Social

Meios técnicos de transmissão

Síntese Hermenêutica

Mensagem

Análise Formal ou Discursiva

Análise semiótica

Análise de conversação

Análise sintática

Análise narrativa

Análise argumentativa

Receptor

Análise sócio-histórica da apropriação

Interpretação das Mensagens

Mapa das diferentes interpretações

Re-interpretação da interpretação

Fonte: próprio autor resumindo Thompson

  • Inicialmente (THOMPSON, 1995, 366), o objetivo da análise sócio-histórica é reconstruir as condições sociais e históricas de produção, circulação e difusão das narrativas. As situações de tempo e espaço em que as narrativas foram produzidas; os campos de interação (face-a-face, interação mediada, quase interação mediada, etc) em que elas foram contadas; as instituições sociais que as produziram; a estrutura social (as classes sociais, as relações entre gêneros e outros fatores sociais permanentes) e os meios técnicos de construção e transmissão das narrativas (sua fixação material e sua reprodutividade técnica).

  • Em um segundo momento, toma-se a narrativa como um texto, como uma estrutura discursiva relativamente autônoma de sua produção e de seu consumo. Nesse sentido, a análise implica em uma abstração metodológica das condições sócio-históricas de produção e recepção das narrativas. Thompson adota vários métodos de análise. Assim, Thompson utiliza a hermenêutica não como uma alternativa aos outros métodos de análise de formas simbólicas e ideológicas já existentes, mas sim como um referencial metodológico geral, dentro do qual alguns desses métodos podem ser situados e correlacionados entre si (THOMPSON, 1995, 369).

  • Finalmente (1995, 375), na última fase de sua hermenêutica, Thompson leva em conta a interpretação criativa do significado das formas simbólicas em diferentes contextos de recepção, inclusive no próprio contexto do analista/enunciador da interpretação. O estudo analógico dos diferentes contextos de recepção demonstra que por mais rigorosos que sejam os métodos e as técnicas analíticas, eles não podem abolir a liberdade de interpretação dos públicos e das situações em que se encontram inseridos.

No Brasil, Luiz Gonzaga Motta, em Análise Crítica da Narrativa (2013), é o principal introdutor das ideias de Ricoeur no estudo das narrativas mediadas. Por que estudamos narrativas? Para nos conhecermos; para aprender sobre o mundo; para distinguir entre o que é benéfico do que não é; e para “melhor recontá-las”. E nós acrescentaríamos: elas são uma forma de investigação e uma forma de localização no tempo/espaço. Motta apresenta uma proposta metodológica, que consiste em um esquema de a) três planos, b) a definição de três níveis de narração, em que operam c) sete movimentos analíticos. O Plano da expressão (linguagem) corresponde à Descrição; o Plano da história (ou conteúdo) equivale à Análise; e o Plano da metanarrativa (tema de fundo) é a Interpretação.

PLANO DE EXPRESSÃO

PLANO DE CONTEÚDO

PLANO METANARRATIVO

Signo

Significado

Significante

Dentro destes três planos, o analista pode operar os sete movimentos: a intriga, o paradigma, os episódios, o conflito dramático, os personagens, as estratégias argumentativas e a metanarrativa.

O primeiro procedimento analítico é definir a intriga, o plot, da narrativa como um todo. Há um resumo técnico no plano da expressão; um storyline no plano de conteúdo; e uma interpretação de conjunto no plano metanarrativo.

O segundo e o terceiro procedimentos são a decomposição desta intriga principal em diferentes arcos narrativos. Em séries de ficção existem arcos narrativos de temporada decompostas em episódios regulares. Nas análises de narrativas jornalísticas, essas unidades não são uniformes. Aqui também cada procedimento pode ser realizado em cada um dos três planos.

O quarto procedimento consiste em estabelecer os diferentes tipos de conflito da narrativa, os conflitos no plano da expressão, no plano de conteúdo e no plano metanarrativo.

Os personagens podem ser vistos como agentes de funções (Propp), como actantes (Greimas) e de vários outros modos . O importante é descrevê-los nos diferentes planos físico, mental e moral.

Desta descrição, certamente emergirão estratégias argumentativas explícitas e implícitas aos personagens internos da narrativa, mas também entre o destinador e o destinatário externos.

O ´setimo procedimento corresponde a interpretação dessas estratégias.

MOVIMENTO

PROCEDIMENTO ANALÍTICO

1º Movimento: compreender a intriga como síntese do heterogêneo

STORYLINE

Resumo-síntese

2º Movimento: compreender a lógica do paradigma narrativo

Decomposição dramática da narrativa em temporadas

3º Movimento: deixar surgirem novos episódios

Decomposição dramática da narrativa em episódios

4º Movimento: permitir ao conflito dramático se revelar

Identificar conflitos psicológicos e sociais no conflito dramático

5º Movimento: personagem: Metamorfose de pessoa a persona

Funções, actante e outros

6º Movimento: as estratégias argumentativas

Produção de efeitos reais

Produção de efeitos estéticos

7º Movimento: permitir às metanarrativas aflorar

Interpretação

Há ainda nessa metodologia a prescrição de observar três diferentes níveis de narração.

Um exemplo: A protagonista escreve uma carta para seus amigos da ex-escola em que estudava, dizendo que está se adaptando, fazendo novos amigos, etc. O texto é narrado pelo audio da personagem. No entanto, a imagem mostra a personagem sofrendo discriminações e bulling na nova escola. Então, o narrador personagem diz que está tudo bem. O narrador mediador diz que está tudo mal. E o narrador autor diz que a protagonista está mentindo. Essa mesma lógica das narrativas ficcionais pode ser apliacada às narrativas jornalísticas e comunicacionais.

NARRADOR-AUTOR

NARRADOR-MEDIADOR

NARRADOR PERSONAGEM

O primeiro se refere ao autor na tradição literária e é posto por Motta como uma narração institucional do meio de comunicação, é a linha editorial do veículo, em que são defindios os limites e as prioridades. Também pode ser chamado de enquadramento9.

O segundo narrador é o mediador entre o veículo e o público, é o narrador-imaginador das narrativa ficcionais e corresponde aos editores e jornalistas, aos produtores do texto.

E, finalmente, o narrador-personagem são as fontes, os entrevistados, os agentes responsáveis pelas informações primárias.

Produção

Direção

Interação

O público só vê os narradores-personagens, mas quem seleciona e prioriza os temas é a instituição narradora e quem imagina os temas como narrativas são os editores/redatores. Os personagens são organizados e qualificados dentro das narrações anteriores. Hoje, no entanto, em virtude da presentificação das narrativas audiovisuais, os narradores-personagens estão ganhando autonomia em relação aos outros níveis de narração.

  1. A Narrativa Mediada

Nos dias atuais, a grande maioria das estórias que nos contaram e que nós contamos são midiatizadas, são transmitidas, distribuídas e recebidas através de meios de comunicação eletrônicos – combinando as linguagens oral, escrita e audiovisual. Houve um tempo em que as narrativas eram apenas orais; houve um tempo em que elas foram predominantemente escritas; e, hoje, combinando a oralidade e o texto, as narrativas são audiovisuais.

TABELA 1 – Narrativas segundo o suporte

LINGUAGEM

ELEMENTO CHAVE

ÊNFASE

DOMINÍO

Narrativas orais

Aqui e agora

Mensagem

Identidade local

Narrativas escritas

Metalinguagem

Transmissor

Sujeito universal

Narrativas audiovisuais

Fabulação

Receptor

Globalização



As narrativas audiovisuais atuais são ainda: a) interculturais (mesclando o local e o universal); b) seriadas (fragmentadas em episódios durante longo períodos de tempo); c) virtuais (acontecem simultaneamente em vários locais ao mesmo tempo para um público não-presencial); e d) interativas/segmentadas (com a internet, o público deixou de ser passivo e passou a interferir de vários modos na construção da narrativa, orientando o narrador e os personagens). Na verdade, há uma reunificação dos contextos dos interlocutores, dissociados no tempo/esáço pelas narrativas escritas.

Antes da escrita, toda comunicação era presencial entre interlocutores partilham de um mesmo contexto, sediada no corpo, principalmente na fala. Chama-se isso de 'mídia primária' (PROSS, 1997)10. As narrativas eram orais e o corpo era a memória principal. Com a escrita e a história, os contextos de transmissão e de recepção se dissociam. A 'mídia secundária' é formada por suportes extra corporais que fixam as narrativas no tempo espaço. Há um único contexto de transmissão para muitos de recepção. E ‘mídia terciária’ ou elétrica implica na existência de suportes tecnológicos nos dois polos da comunicação. Há muitos contextos de transmissão e muitos contextos de recepção. A noção de ‘mídia terciária’ engloba tanto os meios de comunicação tradicionais como também a internet; a ‘mídia secundária’ corresponde à linguagem; e a ‘mídia primária’ insere o corpo como suporte.

As narrativas orais enfatizam a própria narrativa e definem identidades simbólicas locais. As narrativas modernas são ‘históricas’, centradas no narrador e na metalinguagem, se destinando a um receptor passivo e no sujeito universal. E, nas narrativas audiovisuais, a ênfase está na narratividade do receptor, a fabulação.

Em outros textos (GOMES, 2022a), comparou-se o efeito conjunto dessas três mídias ao mito das moiras e a noção de uma máquina mimética de três operações sistêmicas: memória do passado, auto observação descritiva do presente e simulação de possibilidades futuras. Essas três operações formam o mecanismo de autopoesis, de criatividade sistêmica. As moiras seriam uma representação desta máquina cognitiva, antagonista do homem. Porém, essa narrativa do protagonista contra as estruturas narrativas do tempo implodiu diante de novos valores e de um novo tipo de protagonismo/antagonismo. Nos últimos anos, o protagonismo tornou-se feminino e a sociedade patriarcal tornou-se a antagonista de grande parte das narrativas. Hoje percebe-se que não é suficiente que as mulheres se tornem protagonistas das próprias vidas, elas têm também que contar as próprias histórias.

O aspecto feminino não aceita mais seu antigo papel (de par romântico e refém do vilão) e torna-se também protagonista/narradora de sua identidade e de suas narrativas. A jornada da heroína cria um roteiro de desenvolvimento interior (inclusive e principalmente para os protagonistas masculinos). Maureen Murdock (MARTINEZ, 2008, 139) era uma psicóloga que trabalhava com empoderamento de mulheres em situação de vulnerabilidade e através do processo de crescimento de seus pacientes elaborou a Jornada da Heroína. E o novo roteiro está gerando um tsunami de narrativas de protagonismo feminino, bem como trabalhos acadêmicos a respeito.

I. Formação do feminino; II. Identificação com o masculino e reunião de aliados; III. Caminho das provações; IV. Encontrando o sucesso; V. Despertando os sentimentos de morte espiritual; VI. Iniciação e descida à deusa; VII. Apelo urgente para se reconectar com o feminino; VIII. Curando a divisão entre mãe e filha; IX. Curando o masculino ferido; X. Integração do masculino e feminino.

É a vida que imita a arte que imita a vida ou será que a arte que imita a vida que imita a arte? Quem veio primeiro: a narrativa ou o contexto? Esta é a dialética entre mimesis e diegesis. O contexto mostra; a narrativa conta. Mas, ambos são indissociáveis. Assim tanto as narrativas femininas formam um novo contexto das relações entre os sexos como o novo contexto forma ainda mais novos protagonismos. E não se trata simplesmente trocar o gênero dos protagonistas. Há uma mudança dos valores masculinos (a conquista do poder, a justiça e a verdade acima dos interesses) por valores femininos (o cuidado, a solidariedade, a afetividade). Ao inves da superação através dos desafios de risco, entrar em contato com a própria essência.

Conclusão

Revisamos as principais contribuições teóricas e metodológicas, que cumulativamente formaram os Estudos Narrativos: Propp, Campbell, Levi-strauss, Greimas, Barthes, Eco, Ricoeur e Motta. Ressaltamos algumas metodologias de análise de narrativas. Definimos a narrativa audiovisual em relação às narrativas orais e escritas, observando suas principais caraterísticas, inclusive o aparecimento do atual fenômeno do protagonismo feminino.

Transmutações da Jornada Heroia - O épico, o tragicômico e o feminino (2022b) descreve o conceito original da Jornada do Herói, de Joseph Campbell, demostrando o impacto da narrativa cristã sobre o modelo e seus principais desdobramentos narrativos: as histórias de Hamlet, de A Divina Comédia de Dante e de Don Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes. Ao final, há uma transformação radical na armadura narrativa da Jornada, que passa a ser feminina, tanto em seu protagonismo como nos valores embutidos em suas narrativas .



REFERÊNCIAS

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BARTHES, Roland. A Morte do Autor. In: BARTHES, Roland. O rumor da língua. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

______ Elementos de semiologia. Tradução de Izidoro Blikstein. São Paulo: Cultrix/ Editora da Universidade de São Paulo, 1971.

______ Mitologias. Tradução de Rita Buongermino e Pedro de Souza. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1972.

______ Fragmentos de um discurso amoroso. Tradução de Márcia Valéria Martinez de Aguiar. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2003.

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BENJAMIM, Walter et al. Textos escolhidos – vida e obra. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Brasiliense, 1985. .

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_____ A mediação do protagonismo feminino: Jessica Jones e a pseudo-heroína In: Comunicação e mediações - novas perspectivas.1 ed.São Paulo: ECA/USP, 2021, v.01, p. 227-252.

______Autopoesis & as três mídias:máquina mimética e teoria sistêmica da comunicação. Temática - Revista eletrônica de publicação mensal. , v.18, p.195 - 206, 2022a.

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GREIMAS, Algirdas Julien. Semântica estrutural. São Paulo: Cultrix, 1976.

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LEVI-STRAUSS, Claude. O cru e o cozido: Mitológicas I . São Paulo: Cosac Naify, 2004.

_____ Do mel às cinzas: Mitológicas II São Paulo: Cosac Naify, 2005.

_____ A origem dos modos à mesa: Mitológicas III . São Paulo: Cosac Naify, 2006.

_____O Homem nú: Mitológica IV. São Paulo: Cosac Naify, 2011.

_____ Tristes trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

MARTINEZ, M (2008). Jornada do herói: a estrutura mítica na construção de histórias de vida em jornalismo. São Paulo: Annablume.

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PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2003.

PROPP, Vladimir. Morfologia do conto popular. Lisboa: Editora Vega, 1978.

PROSS, Harry. A sociedade do protesto. São Paulo: Annablume, 1997.

RICOEUR, Paul. Tempo e Narrrativa (1983; 1984; 1985); Tradução de Constança Marcondes Cezar; Marina Appenzeller; Roberto Leal Ferreira. Campinas:Papyrus, 1994; 1995; 1997.

THOMPSON, John B. Ideologia e Cultura Moderna – teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis: Vozes, 1995.

VOGLER Christopher A Jornada do Escritor, São Paulo: Nova Fronteira 2006.



1Estrutura narrativa em animações Disney e Morfologia do Conto de Propp <https://youtu.be/oaB-3KxMIwM> versão audiovisual do TCC/monografia 'Uma Introdução aos Fundamentos da Narratologia' – de Keven Fongaro Fonseca em Cinema e Audiovisual pela UFF, 2019.

2O livro O poder do Mito é a transcrição de um documentário homônimo da BBC, uma longa entrevista de Bill Moyers com Josph Campell, editada em cinco episódios disponíveis em: <https://youtu.be/kFzT03JL9X0>

3 O que faz um herói? - Matthew Winkler. https://youtu.be/Stdko2NIUNI


4Resumido pelo autor a partir do livro O cru e o cozido (LEVI-STRAUSS, 2004).

5Trata-se de um extenso estudo sobre o tabaco.

6Originalmente um dossiê da revista Communication de 1966.

7BRANDINI, Laura Taddei. Roland Barthes no Brasil, via traduções < https://pdfslide.net/documents/5-laura-taddei-brandini-34indd.html >

8 O artigo Comunicação e hermenêutica: apontamentos para uma teoria narrativa da mídia (GOMES, 2012) analisa os três volumes de Tempo e Narrativa, fazendo analogias com o campo da comunicação.


9A noção de Enquadramento (ou frame temporal) foi originalmente formulada por Goffman como “os princípios de organização da experiência cotidiana”, sendo apropriada pelos estudos da mídia por vários autores contemporâneos importantes, como Gaye Tuchman. No Brasil, Mauro Porto é o grande introdutor da noção de enquadramento nos estudos de mídia, tanto no jornalismo impresso como no telejornalismo.


10Para teoria das três mídias de Pross, a mídia primária é o corpo e a comunicação presencial (sons, ruídos, gestos, aparência, odores e, principalmente, a fala). A mídia secundária são as marcas sobre outros suportes (pedras, ossos, metal, couro, madeira e, principalmente, papel). A escrita, expressão maior da mídia secundária, amplia a memória, possibilitando a comunicação através do tempo/espaço e a história. E a mídia terciária, surge com a eletricidade e marca o retorno da imagem e da simultaneidade do tempo.