domingo, 1 de novembro de 2020

Teoria da Comunicação

 


O MAPA DAS IDÉIAS SOBRE A MÍDIA

Em um primeiro momento, abordaram-se aqui as definições de cultura elaboradas a partir da ênfase nos contextos sócio históricos do emissor (o positivismo, o funcionalismo, o marxismo). Depois, apresentaram-se as definições de cultura que ressaltam a linguagem (o estruturalismo, a semiótica). E, finalmente, chegamos as definições elaboradas a partir dos contextos sócio históricos da recepção (a midiologia e a sociologia da mídia).


EUA

EUROPA

FUNCIONALISMO

(Parsons, Lasswell, Moles e Merton)

ESCOLA DE FRANKFURT

(Benjamim, Adorno, Habermas)

2 Guerra Mundial (1945)

CIBERNÉTICA

(Nobert Wiener) McLuhan

SEMIÓTICA E ESTRUTURALISMO

Contracultura (1968)

MIDIOLOGIA (Debret, Barbero, Flusser) X

SOCIOLOGIA DA COMUNICAÇÃO (Castell, Morin, Thompson)


Na Europa, Houve um longo caminho teórico do estruturalismo até à Pós-modernidade: Lévi-Strauss (a estrutura como grande síntese); Lacan (o inconsciente linguístico); Bourdieu (teoria dos campos); Foucault (análise discursiva e genealogia do poder); Baudrilard (sedução e simulacro) e outras Semióticas (Peirce, Barthes, Eco, Greimas, Bystrina) das quais não falamos.

Elegemos Habermas e a noção de democracia deliberativa como sendo a contribuição mais importante deste percurso. Democracia deliberativa é a democracia representativa ampliada através dos meios de comunicação1.

A noção de democracia deliberativa é baseada na sociedade se estruturar em um tripé entre: a ação instrumental (o campo econômico, a objetividade e a esfera privada); a ação estratégica (o campo político, os sujeitos históricos e a esfera pública); e a ação comunicativa (o campo cultural, a intersubjetividade e a sociedade civil).

Nos EUA, também houve um longo percurso de desenvolvimento teórico: a Teoria hipodérmica é a primeira tentativa de explicar o comportamento condicionado pela mídia e acreditava na manipulação completa das massas através dos meios de comunicação. Em seguida, veio a Teoria da Persuasão, abordagem psicológico experimental baseada na retórica de Aristóteles: Harold Lasswell e a análise de conteúdo (quem diz o quê por meio de qual meio a quem com que efeito?) Surge, então, a abordagem funcionalista. Robert Merton, Abraham Moles, Paul Lazarsfeld. A questão de fundo já não são os efeitos mas as funções exercidas pela comunicação de massa na sociedade. Estudo da comunicação a partir do problema do equilíbrio e do conflito sociais. A cibernética, o sistema tende a entropia e não a homeostase; a disfunção é compreendida como ruído. Os feedbacks promovem auto organização contra a incerteza.

A cibernética e McLuhan (a midiologia) são aperfeiçoamentos da sociologia funcionalista. Como também são as novas abordagens (Agenda-setting, Gatekeeper, Newsmaking, Espiral do silêncio) sobre os receptores, os processos produtivos nas comunicações ou sobre os fatores internos e externos à organização do trabalho comunicativo.

Elegemos Marshall McLuhan e o conceito de mediação como os mais importantes deste segundo percurso.

E mediação não é o mesmo que midiatização2. Mediação com ‘e’ é um agenciamento que transforma conflitos em diálogos simbólicos. Já ‘midiatização’ (com ‘i’) significa um regime em que as relações entre diferentes agentes são mediadas (com ‘e’) pelos meios de comunicação. Diz-se que algo foi ‘midiatizado’ quando sua existência virtual se torna mais importante do que sua materialidade.

Da mesma forma que uma sociedade não formula problemas que não seja capaz de responder, também podemos dizer que as diferentes definições da noção de cultura refletem diferentes tempos e etapas de nossa vida social recente. Vivemos em um tempo midiático. Nada mais normal que nossa definição de cultura ser baseada nas ideias de mediação e de midiatização da sociedade.

Mas, o que exatamente significa ‘mídia’? E quais as mudanças ela coloca na prática de contar estórias? Pode-se entender o conceito de mídia em três sentidos diferentes: o sociológico (a mídia é o conjunto dos meios de comunicação); o midiológico (a mídia é o suporte de uma mediação, por exemplo: o relógio de pulso (mídia) é uma mediação entre o batimento cardíaco e o tempo social); e a teoria das três mídias de Pross (1997).

No primeira definição, a mídia é uma instituição de poder simbólico, ao lado de outras instituições de poder simbólico (como a igreja, a escola); em uma sociedade formada ainda por instituições de poder econômico (fábricas, empresas), de poder político (governos, parlamentos, tribunais) e de poder coercitivo (polícia, exército). A centralidade da mídia sobre as outras instituições, deste ponto de vista, se dá pela sua capacidade de circulação e distribuição de imagens e informações de forma simultânea para um grande número de pessoas.

O conceito de mídia como suporte de mediação foi criado por McLuhan (1964) e seguido de diferentes modos por Kerckhove (1997), Debret (1993), Martin-Barbero (1997), Levy (1993), entre outros. Este grupo tende a ver o mundo como um conjunto de mediações simultâneas. A escrita é uma tecnologia de reforço e ampliação do tempo histórico (da memória social e do pensamento científico objetivo) em um universo de eventos simultâneos. Para eles, a TV (e a internet) apenas nos torna conscientes da simultaneidade temporal do universo – da qual estávamos parcialmente esquecidos.

E há também a teoria das três mídias de Harry Pross (1997) - adotada por Bystrina (1995), Flusser (2007, 2008), Baittello Jr. (2010), entre outros - uma sofisticada interpretação culturalista dos processos de comunicação atual. A teoria que combina aspectos das definições anteriores e ainda insere o corpo como suporte comunicativo, propondo um modelo ternário semelhante ao das ‘tecnologias da inteligência’ de Levy. Por "mídia primária" entende-se toda comunicação presencial, em que os interlocutores partilham de um mesmo contexto, sediada no corpo, principalmente na fala (PROSS, 1997). Levy (1993) chama-a de modo de interação um-um. Neste contexto, a comunicação é sempre oral e a recepção é a memória do corpo, a imitação de gestos, sons, palavras. E o consumo é coletivo e se confunde a produção econômica de bens materiais e simbólicos. Na mídia primária, o consumo e a recepção são presenciais e espontâneos, ancorados no corpo como suporte em um contexto único de interlocução. O que é produzido comunitariamente; é consumido pelo grupo.

"Mídia secundária" aqui é entendida como a comunicação em que os contextos de transmissão e de recepção se dissociaram. Segundo Pross, é formada por suportes extra corporais em que a mensagem fica fixa no tempo e no espaço. A mídia primária do ponto de vista social e cognitivo é um fator determinante para o aparecimento da história, da memória social, do pensamento científico objetivo. Para Levy, é o modo de interação um-muitos, em que um emite e os outros recebem passivamente.

Neste cenário, a recepção é formada por representações mentais foneticamente codificadas da realidade - a memória social objetiva, descontextualizada e mimetizada através de representações mentais codificadas. Com a escrita, surge a divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual, entre a produção de bens materiais e a produção de bens simbólicos. E o consumo passa a ser dissociado da produção. A equivalência econômica do modo de interação um-muitos é o modelo industrial em que alguns poucos produzem e muitos consomem. O consumo deixa assim de ser grupal e se individualiza: o leitor como receptor da escrita é análogo ao consumidor individual.

Assim, na mídia secundária, surge à recepção do signo, a representação mental descontextualizada e codificada em marcas fonetizadas; e com ela: a práxis histórica, a memória social e a percepção objetiva do tempo.

Em contrapartida, o consumo torna-se pouco a pouco individual e se divorcia da produção social. E a própria produção material aparentemente se dissocia da produção de bens simbólicos. A sociedade se industrializa economicamente e se desencanta culturalmente. A reprodução social (os esquemas subjetivos) modifica as condições objetivas de produção social.

A mídia secundária não anula a primária, mas se sobrepõe a ela. Assim, a recepção e o consumo primários continuam ativos nos contextos dos processos secundários de industrialização cultural. Mas, também é importante observar que gradativamente, no decorrer dos últimos séculos, a comunicação secundária tornou-se dominante culturalmente.

E mídia terciária ou elétrica, segundo Pross, implica na existência de suportes tecnológicos nos dois polos da comunicação. Há dois momentos aqui: a televisão, quando a mídia terciária funciona ainda de forma unilateral; e as redes sociais interativas, que funcionam em um modelo descentralizado, que Pierre Levy entende como o modo de interação muitos-muitos.

Com o advento da mídia terciária, a recepção tornou-se uma experiência do corpo recontextualizada por imagens e sons mediados por tecnologia. Com a televisão, a própria cultura se industrializa: irrompe a recepção fragmentada das narrativas seriadas e o comportamento de consumo de massa. Consumo, além de padronizado e uniforme, posto em universo cultural de repetição mecânica, de acumulação e gasto em intervalos regulares e constantes. As rotinas de consumo são retroalimentadas pelas narrativas seriadas que as representam.

No entanto, é preciso observar que ela também representa um aperfeiçoamento progressivo do termo e de suas definições anteriores. Para compreendermos que há uma mediação externa e uma mediação interna às relações sociais foi necessário entender as definições antropológica e sociológica de Cultura.

Também podemos dizer que para explicarmos a mediação interna da cultura foi necessário estudar as definições voltadas para a crítica do papel dissimulador da cultura (freudiana, marxista e estruturalista); enquanto para definir a mediação externa da cultura com o meio ambiente foi preciso revisar as definições que enfatizam a consciência coletiva, a identidade social, a memória e a ciência (positivistas, funcionalista e cibernéticas).

A cultura como dupla mediação social combina do conceito de Meio de McLuhan com a noção de democracia deliberativa de Habermas. Ação comunicativa é o cimento e o combustível das relações sociais (ambientais e culturais).

LEIA MAIS EM: A cultura como dupla mediação social


NOTAS

1 Habermas foi associado a Gramsci pelo eurocomunismo, fundamentando uma estratégia de chegar ao poder pela via eleitoral (e através da organização política da sociedade civil ampliando a esfera pública).

2 Há extensas discussões sobre os termos ‘mídia’ e ‘média’ como traduções do conceito de ‘Meio’ do inglês e do latim. A ideia de que a sociedade é um conjunto de mediações e que existem três meios fundamentais (a fala, a escrita e o vídeo) é o que faz de McLuhan um pioneiro e que caracteriza a midiologia como movimento teórico, incluindo não apenas Martin Jesus Barbero e Regis Debret, mas pensadores como Flusser e Pross.

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