Sistemas Sociais e Comunicação em Luhmann
Outro
sociólogo contemporâneo importante é o alemão Niklas Luhmann (2005), em pelo
menos três pontos: a redefinição do conceito de Sistema, a diferenciação dos
sistemas sociais dos sistemas mentais e biológicos e uma concepção de
Comunicação.
Sistema – para o
funcionalismo - é um conjunto cujos diferentes elementos interagem entre si,
desempenhando funções de integração e de manutenção do sistema. A interação dos
elementos produzia uma ‘homeostase’ – um equilíbrio interno responsável pela
estabilidade do sistema durante o tempo. Para o funcionalismo, a comunicação já
era um fator de equilíbrio e de mediação dos conflito sociais (em oposição à
teoria de manipulação hipodérmica e à teoria da persuasão de Lasswell).
Para cibernética, o
sistema tende para a entropia e não a homeostase; a disfunção é compreendida
como ruído. Os feedbacks promovem auto organização contra a incerteza. A
comunicação passou a ser vista como um fator de aperfeiçoamento sistêmico para
diminuição da entropia. A comunicação é o inverso que do ruído: a comunicação
objetiva a homeostase e auto regulação; o ruído é a própria manifestação da entropia
e da dissolução do sistema.
O estruturalismo não dá
nenhum sentido especial a ideia de comunicação e a noção de estrutura toma
parte das características do conceito de sistema (totalidade, unicidade), que
fica então reduzido a espaços de sincronia, áreas de simultaneidade dentro de
um conjunto de regras estruturais. Lévi-Strauss considera a Estrutura Social é
formada pelos sistemas de parentesco, de bens e de linguagem – por exemplo. A
estrutura é invisível e está por trás dos sistemas, sendo formada por relações
e conexões recorrentes, que, com o tempo, se tornam regras estruturais
“ocultas”, responsáveis pela reprodução social dos sistemas.
O biólogo chileno Umberto
Maturana vai redefinir a ideia de Sistema através da noção de autoreferência
sistêmica (o sistema que observa a si próprio) e de autopoesis (o sistema que
produz e reproduz a si mesmo). Nessa definição, o importante não é a interação
dos elementos internos, mas sim a relação entre a auto-organização do sistema e
seu entorno, ou ambiente externo. O novo
conceito de Sistema implica também em um lado de dentro que observa um lado de
fora, isto é, na noção de autoreferência.
O sistema é algo que estabelece relações consigo
mesmo e se diferencia dessas relações frentes às de seu entorno. Sem diferença
com relação ao entorno, não haveria auto referência. Todo o sistema que se
autoproduz, que se faz unidade de diferença, se singulariza e passa a se
constituir numa identidade. O sistema também ganha autonomia, uma vez que
diversifica seus acoplamentos de entrada e saída do ambiente, diminuindo sua
dependência estrutural do exterior.
Luhmann assimila e
aperfeiçoa ainda mais o conceito de sistema autopoético e autorreferente de
Maturana, distinguindo três tipos de sistemas: os biológicos (célula, cérebro,
corpo), os psíquicos e sociais (subdivididos em interações, organizações e
sociedade). Esses três tipos de sistemas são interpenetrados uns aos outros.
Somos sistemas biológicos que se observam através de um sistema psíquico
condicionado por um sistema social. Os três sistemas tem interseções e entornos
próprios, incluindo/excluindo parte dos outros dois sistemas.
Essa
redefinição/desenvolvimento do conceito de Sistema tem um significado
avassalador para a tradição do pensamento sociológico. Sistema não é uma categoria analítica, mas uma forma de descrição
concreta, que leva em conta a complexidade da realidade.
Luhmann assimila e supera
várias etapas da reflexão sociológica: a sociologia das representações coletivas
(Durkhein), as sociologias da ação social (Weber, interacionismo simbólico,
etnometodologia), a sociologia da estrutura (derivada de Lévy-Strauss), as
sociologias que combinam ação e estrutura (Parsons, Habermas) e a sociologia
das práticas sociais (Bourdieu, Giddens).
No modelo sistêmico não
existe nem ação nem estrutura, nem sujeito nem objetividade, apenas o sistema/entorno,
em seu crescimento através de operações de diferenciação voltadas para dentro,
reduzindo a complexidade externa através da auto-organização. Os sistemas se
assemelham a filtros da complexidade da vida. A atividade autopoesis ou
auto-organização é assim uma conquista de autonomia do sistema em relação às
incertezas do ambiente externo. Há quatro formas de diferenciação: segmentação
(horizontal), estratificação (vertical), centro-periférica e diferenciação de
sistema funcionais. Nos sistemas sociais, Luhmann identifica quatro subsistemas
funcionais: adaptação (economia), realização de metas (política), integração
(sistema legal), manutenção de padrões latentes (instituições culturais).
A comunicação, para
Luhmann, é a permuta (de energia, informação, recursos) entre sistemas sociais
e não entre pessoas. Não há transferência de informação ou de conteúdos
semânticos entre emissor e receptor. A Comunicação é produção de redundância
instantânea (uma emulação entre sistemas). Luhmann considera que a comunicação
como unidade discreta de análise sociológica é mais precisa do que a Ação
Social ou a Ação Comunicativa. (LUHMANN, 1997b APUD RODRIGUES, NEVES, 2016, pág.,
86)
Habermas desenvolve uma concepção de sociedade que
leva em conta a centralidade dos processos comunicativos. Mas, Habermas acredita
no intercambio simbólico entre as consciências, pressupõe, uma base consensual
partilhada entre os sujeitos: a intersubjetividade.
Para Luhmann, no entanto, a sociedade não é
formada pelas relações entre os seres humanos, a intersubjetividade não existe
de fato. As pessoas estão no entorno do sistema social. Elas estão fora do
sistema e o sistema está parcialmente dentro delas. Luhmann nos fornece outra
forma de pensar e de descrever a sociedade.
Novos conceitos, velhos problemas
As mudanças do paradigma científico no século
passado, tem como ponto central a questão do observador. A visão do universo
depende do local em que se está. Enquanto para sociologia clássica existe um
sujeito-observador e um objeto observado em uma realidade empiricamente dada;
para Luhmann, o que há são sistemas formando uma realidade. O que chamamos de
indivíduo, ator ou agente; Luhmann chama de sistema psíquico (a sede da auto
referência). É uma perspectiva complexa e um construtivismo
radical.
A ciência tradicional
oscila entre o empirismo e o racionalismo, entre o indutivo e o dedutivo. Na
sociologia de Luhmann, a (auto) observação é uma operação de diferenciação
sistêmica. Os sistema se observam através da observação direta e das
observações de segunda ordem. Luhmann pode parecer relativista e subjetivista à
primeira vista, mas não é. Ele é evolucionista, mas não de uma forma redutora;
pois não se trata de seleção externa, mas sim de auto-organização interno. O
sistema evolui na medida em que conquista autonomia. Sua teoria é bastante abstrato,
mas é voltada para observação e descrição de sistemas e ambientes concretos.
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